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Na contramão das atuais correntes... -
Hans-Georg Fickinger
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. 22,
p
.43-64
maio
/
ago
. 2014.
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reflexão filosófica para dentro da práxis pedagógica como fermento
da mesma. Fiel à tradição da filosofia de Platão, que não fez distinção
entre as duas áreas, proponho que a Pedagogia a trate também como
elementos nela amalgamados.
Como vimos acima, os fatores responsáveis pela não
concatenação entre teoria e práxis pedagógicas remetem a influências
exógenas vindas, portanto, de fora da Pedagogia e deformando-a no
seu caráter originário. A Ética utilitarista, a orientação normativo-
burocrática, a racionalidade técnico-instrumental, o princípio
de objetividade – nenhum desses referenciais surgiu a partir de
experiências propriamente ditas pedagógicas; ou seja, nenhum deles
se coaduna com o espírito intrínseco à Pedagogia. É necessário,
portanto, que ela recupere a sua dinâmica própria, expelindo de
si o que a ela é estranho como um cancro, voltando a ser o que
Platão nela descobria e concretizava em seus diálogos, encenando
filosoficamente o enlace entre o saber, o ensinar e o aprender.
Sem poder estender-me na análise dos recursos pedagógicos
utilizados por Platão em seus diálogos, aponto alguns aspectos
indicativos da evolução endógena da reflexão filosófico-pedagógica,
de que dão testemunho. Encontramos, nesses diálogos, dois
conceitos-chave característicos do desdobramento indicado:
maiêutica
e
não-saber.
Ambos conceitos apontam a uma dinâmica
que enlaça os participantes e os leva a experimentar o processo
de aprendizagem como ativação de um potencial neles desde
sempre presente, mas em estado latente e como que adormecido.
A encenação dos diálogos ocorre de modo a levar os personagens
a refletir sobre o que acreditam saber por tê-lo ouvido de outros;
e vai, aos poucos, destruindo essas convicções julgadas até aí
inabaláveis. O resultado é uma perda total do terreno seguro, em
que os participantes pensavam estar assentados, o que os obriga a
repensar os argumentos fundadores das certezas anteriores.
O que indica o conceito de maiêutica? Ele aponta para o
pensar que se dá por um processo a partir de dentro e arrancando
de si mesmo o novo a que deseja chegar e pelo qual se pergunta.
A figura central dos diálogos platônicos é Sócrates. Todos sabemos
quem é Sócrates e conhecemos uma série de anedotas a seu respeito.
Também sabemos que sua biografia pessoal lembra-nos dele como
o grande mestre da maiêutica ou como “parteiro de ideias”. Ele
não é, em todo caso, o mestre-instrutor habitual, que transmite ao