Cadernos de Pesquisa - Volume 9 - número 22 - page 217

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Infância e filosofia... -
Vilmar A. Pereira e Jaqueline C. Eichenberger
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. 2014.
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desse infantil no sentido de superação e progresso. A superação é
necessária a fim de que possamos nos livrar dos preconceitos de nossa
infância, pois é nessa fase que o espírito é muito distinto do corpo.
Este é um aspecto central no pensamento de Descartes (1987).
Aliando à noção de infância cartesiana a de subjetividade,
fica evidente o viés teórico que assume Descartes. O sujeito por ele
pensado não pode estar preso a qualquer relação de dependência
com o mundo sensível. Se a infância significa isso, ela deve ser
superada, pois do contrário seria ela mais um entrave para o
desenvolvimento da subjetividade. Corroborando com essa forma de
pensar, observa-se que, conforme Matos (1999, p.44), em Descartes,
“o domínio intelectual do mundo e de si próprio supõe a ruptura
voluntária do sensível e de suas imagens”. Em diversas passagens,
fica evidente que o universo das manifestações dos sentidos (o qual
preenche grande parte da existência infantil) não possui espaço na
metodologia cartesiana, pois não leva àquela condição de segurança
que almeja a identidade dessa nova subjetividade, e, conforme
Descartes (1987, p.62), “deve-se observar que falo de nossa razão
e não de nossa imaginação ou de nossos sentidos”.
Como partícipe da modernidade e da ideia de auto conservação,
Descartes postula o elemento de base racional de suma importância
no sentido de entender as pretensões do homemmoderno. É dele que
herdamos a moderna concepção de razão vinculada necessariamente
ao conceito de subjetividade. Uma subjetividade que força a nova
compreensão de consciência como o eu interior, possibilitando uma
análise de todo o conteúdo do pensar. É uma consciência que não
se encontra segregada da consciência de si. Funde-se numa só
consciência. Ou, dito de outro modo, Descartes (1987) autoriza
que o homem moderno possa apoderar-se de si. E isso só pode
ocorrer pela razão ou pelo intelecto. Como racionalista, não admite
o conhecimento a partir dos dados da sensibilidade.
Pensando na mesma linha que Gagnebin (1997), observa-se
que a infância, pensada sob o ponto de vista da tradição cartesiana,
em algummomento incorrerá em contradições, já que irá deparar-se
com paixões, pecados e erros. Trata-se de uma zona escura sem os
caminhos que traçam as palavras e que ilumina a razão e consiste
na expressão de nossa miséria humana e também, no entanto, é
o único solo, no qual é possível que brote a razão que faz falta à
subjetividade, que almeja autoconservar-se.
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