Experiência e vida danificada... -
Franciele Bete Petry
et al.
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n
. 22,
p
.109-130
maio
/
ago
. 2014.
Disponível em <
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Mas a perda da experiência e da capacidade de comunicá-las,
por meio da narração, não se radica apenas no contexto de uma
situação limítrofe. Se outrora a impossibilidade da experiência
estava vinculada, sobretudo, a eventos que rompiam com a
regularidade e o ritmo da vida cotidiana, como o caso de uma
guerra, na modernidade – e essa é a grande diferença – em função
do enorme desenvolvimento da técnica essa situação não constitui
mais uma exceção. Tomando como fonte a expressão que a vida
nas grandes cidades, tais como Londres, Berlim e especialmente
Paris, com seus ritmos, desafios, antagonismos, infortúnios e, de
maneira notável, com sua personagem principal, a
multidão
, ganha
nos movimentos artísticos do final do século XIX e início do XX,
especialmente na literatura, com Baudelaire, Victor Hugo, Edgar
Allan Poe, Ernst Theodor Amadeus Hoffmann – mas também em
intelectuais como Friedrich Engels e Karl Marx –, Benjamin busca
entender as ambiguidades dos processos de transformação que se
tornavam, a cada dia, mais intensos. Exemplar é a interpretação
do clássico de Poe,
O homem da multidão
, associando-a a
apontamentos do capítulo XIII de
O Capital
(MARX, 1985) sobre
o desenvolvimento da maquinaria na sociedade capitalista. Marx
destaca o adestramento do operário industrial, especialmente
na figura do trabalhador não especializado, o automatismo e os
gestos abruptos com que Poe descreve os passantes na multidão –
expressões, portanto, da vida ordinária nas grandes cidades. Para
Benjamin, no livro de Poe a multidão é caracterizada com a mesma
uniformidade dos movimentos automatizados do trabalho na
esteira de produção: “à vivência do choque [Chokerlebnis] sentida
pelo transeunte na multidão, corresponde a ‘vivência’ [Erlebnis]
do operário com a máquina.” (BENJAMIN, 1994, p. 209).
As correlações que Benjamin estabelece sobre o emprego
da técnica e sua vinculação com o estreitamento da experiência,
tanto em uma situação fronteiriça, como na guerra, quanto
com o embrutecimento dos gestos na vida cotidiana e com o
desenvolvimento das forças produtivas, tem íntima conexão
também com outro importante mote da obra de Adorno: a
indústria
cultural.
No já referido aforismo 33 da
Minima Moralia
, vemos
como esses elementos se entrecruzam na crítica de Adorno ao
processo de
estetização da guerra
– em mais um tributo a Benjamin
– promovida pelos modernos meios de comunicação. Embora