Cadernos de Pesquisa - Volume 9 - número 22 - page 163

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Do conceito de formação humana... -
Lúcia Schneider Hardt
et al.
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. 9,
n
. 22,
p
.155-174
maio
/
ago
. 2014.
Disponível em <
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uma segunda fonte de desequilíbrio especificamente humano. Ela, a
razão, chamada certamente pela natureza a desenvolver-se, fecha
as portas aos seus “outros”. Dentre eles, o sentimento que, em
Rousseau, opõe-se à potência desregrada de virtualidade que carrega
a faculdade racional, mas, se emanado da consciência – espécie de
reservatório inato dos valores estético-morais – representa o ponto
estável da natureza humana. Sentimento esse que, primordialmente,
bifurca-se em “amor de si” e em “piedade” e que mais tarde, a
depender de condições históricas ideais, poderá manifestar-se
de dois modos: o primeiro, atualizado socialmente de maneira a
não se transformar em egoísmo; o segundo, metamorfoseado em
sentimento de justiça. E para isso concorre a razão sã, cujas fronteiras
estão delimitadas pela capacidade de elucidar aquilo que é de fato
importante para nós.
Acerca da função da razão na antropologia de Rousseau,
Jacques Ulmann esclarece:
Uma vez que a ação humana não pode mais conservar
a ingenuidade do comportamento animal porque o
homem saiu, pela reflexão, desta confusão com a
natureza, é preciso que a razão, responsável por uma
separação que corre o risco de tornar-se uma oposição
à natureza, imponha-se sobre ela para definir uma
representação da natureza que guiará a ação do homem
equilibrado (1987, p. 79).
Em síntese, a razão deverá trabalhar para não afastar o homem
da natureza, isto é, de si próprio. Daí que razão e sentimento natural
não sejam excludentes. Porque, assim como o sentimento, é ela
também natural. O que importa, pois, é refletir sobre as condições
mesmas de seu desenvolvimento, desenvolvimento este certamente
condicionado pela desenvolução da vida social e cultural. Progresso
da razão e avanço da sociabilidade ou da cultura são, dessa maneira,
solidários.
Poderíamos nos contentar com essa última síntese, mas o que
de fato ocorre é a dificuldade de manejar uma filosofia da educação
na qual a sociedade e a educação aparecem, ao mesmo tempo, como
fontes de corrupção e de redenção. Talvez seja esta simultaneidade
de direções que dificulte nossa compreensão quanto aos pressupostos
que sustentam o modelo formativo e educacional rousseauniano.
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