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Ética, educação e desafios contemporâneos -
Divino José da Silva
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. 9,
n
. 22,
p
.175-192
maio
/
ago
. 2014.
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qualquer que pode dizer qualquer coisa de qualquer lugar: por essa
razão, produzem a intimidação, ao mesmo tempo em que fazem
circular formas de dominação.
Na sociedade do espetáculo, ressalta Kehl (2004), o indivíduo
ficou refém das imagens que o mercado produziu dele, com base
nas quais se representa e se relaciona com os demais. Imagens
fetichizadas, cuja lógica se expressa no argumento seguinte: “o
que aparece é bom; o que é bom aparece” (p. 49). O que significa
dizer que o reconhecimento do indivíduo pelos outros depende da
visibilidade, enfim, do espetáculo que ele dá de si mesmo. Assim,
segundo Costa (2006, p. 231), o dilema moral vivido na atualidade
já não passaria pela “escolha entre ter e ser”, mas pela “escolha
entre ser e parecer”, que representa a “faceta mais dura e alienante
da felicidade das sensações.” Ao agir orientado pela lógica da
visibilidade, o sujeito perde sua capacidade de julgamento, já que é
regido pelo desejo e a fantasia de pertencer à realidade-espetáculo.
Essa imagem-espetáculo, a qual porta em si formas de dominação
e subjugação, se sustenta em preferências, afetos e simpatia, pois a
publicidade, explica Khel (2004, p.61), desperta sentimentos, desejos
e vende sonhos, atitudes e valores mobilizando no nosso inconsciente
“objetos imaginários de satisfação do desejo”.
Nesse sentido, parece que estamos mergulhados na cultura do
narcisismo
5
, que se alimenta da cultura do consumismo. De acordo
comCosta (2004), um dos suportes sobre o qual os indivíduos baseiam
seu sentimento de identidade é o narcisismo. Esse sentimento de
identidade teria se deslocado do controle de instituições, como a
família, o trabalho, a religião, para o próprio indivíduo: “Basear a
identidade no narcisismo significa dizer que o sujeito é o ponto de
partida e chegada do cuidado de si. Ou seja, o ‘que se é’ e o ‘que se
pretende ser’ devem caber no espaço da preocupação consigo.” (p.
185). As instituições até podem interessar ao narcisista, mas somente
enquanto meio para a realização de seus interesses vinculados ao
reconhecimento social e à imagem do bem-sucedido, do ponto de
vista econômico e emocional. Alcançar a felicidade tem a ver com
o atendimento das demandas sensoriais. Assim, a virtude moral
5 Seguimos aqui o sentido que Costa (2004, p 185) atribui ao termo narcisismo, o qual “é
entendido como uma vertente do individualismo contemporâneo particularmente insensível
a compromissos com ideais de conduta coletivamente orientados”, distanciando- se,
portanto, do sentido que lhe atribui a psicanálise, enquanto “a condiçãomental indispensável
à aquisição do sentimento e da consciência de identidade subjetiva.”